Dirigido por Don Hall e Qui Nguyen, ambos conhecidos pelo trabalho realizado em Raya e o Último Dragão, o novo filme da Disney estreia nos cinemas nessa quinta-feira, 24. Os principais nomes no elenco de dublagem no país são Marcelo Campos (Edward Elric, Yugi Muto e Trunks adolescente) como Searcher Clade, enquanto quem dá a voz para Jaegar Clade é Luiz Antônio Lobue (Kowalski, Dr. House e Piccolo). Abaixo, segue a crítica do filme. Lembrando que ela pode contar alguns spoilers do roteiro!

Principais inspirações de Mundo Estranho

O mundo construído na obra tem diversas fontes diferentes de inspiração, incluindo as obras criadas por Júlio Verne. Nascido em 1828, na cidade de Nantes, na França, é responsável por escrever histórias como “Viagem ao Centro da Terra” (1864) e “A Volta ao Mundo em Oitenta Dias” (1873), livros que encantam leitores de todas as gerações desde o século XIX. Assim como os cenários e criaturas fantásticas criadas por Verne, outra grande inspiração para os autores de Mundo Estranho foram as histórias de fantasia pulp. Não conhece o termo? Continue conosco que explicamos! Pulp fiction (Ficção de Polpa, em tradução direta) são nomes de revistas publicadas em papel barato entre o final do século XIX e os anos 50, populares na América do Norte, do gênero Fantasia, Aventura, Ficção Científica e Terror. Esse tipo de história, por unir diversos fatores com a intenção de reduzir custos, chegava ao mercado com um preço muito abaixo, o que contribuiu para ser difundida entre os leitores, dos quais o diretor Don Hall fez parte e usou como inspiração ao seu mais novo filme da Disney. Inclusive, entre as histórias de maior destaque publicadas por esse formado, está “Conan, o Bárbaro”, uma das principais obras da Fantasia Pulp que ainda permeia o imaginário de muitas pessoas até hoje.

História bonita, mas de arcos confusos

Apesar das grandes inspirações utilizadas pelos diretores do filme na animação de “Mundo Estranho”, a ambientação do universo muitas vezes parece incompleta. A mensagem sobre preservação ambiental, passada em um dos últimos atos do filme, não conecta totalmente com o outro foco do longa-metragem, a relação entre pai e filho. Durante as cenas iniciais, somos introduzidos ao universo e também aos personagens principais que constroem o enredo de Mundo Estranho. Na abertura, que com certeza é uma das mais bonitas produzidas pela Disney em suas obras recentes, conhecemos Jaegar Clade e seu filho, Searcher, por meio do estilo clássico de animação da empresa, o que gera certa nostalgia, principalmente para quem sente falta dos filmes produzidos na década passada. Entretanto, não demora muito para voltarmos à nossa realidade, formada por obras realizadas em computação gráfica e com o estilo 3D, que dominaram a indústria num passado recente. Jaegar Clade é conhecido por seu trabalho como explorador, tendo como maior sonho atravessar as montanhas que isolam a cidade de Avalonia, algo que nenhuma outra pessoa foi capaz. Em uma das expedições, somos apresentados ao primeiro e ao maior problema do filme: o desejo que os pais têm de que seus filhos sigam os mesmos passos deles, sem a liberdade de escolhas. Após uma briga entre pai e filho, Searcher Clade resolve abandonar a expedição de seu progenitor, voltando para casa com as plantas bioluminescentes conhecidas como “Pando”. O potencial delas de produzirem eletricidade é capaz de modernizar a cidade. A história principal, então, avança 25 anos. Agora, Searcher é um fazendeiro renomado, responsável por trazer progresso para a cidade de Avalonia. Casado com Meridian, pai de Ethan e dono do cachorro Legend, Searcher tem a vida que sempre sonhou, apesar de não comentar sobre seu pai com tanta frequência. O momento de paz dele é encerrado quando Callisto Mal, presidente de Avalonia e uma das exploradoras que estava com Searcher quando ele descobriu as plantas bioluminescentes, o informa sobre possíveis problemas que podem destruir toda a plantação e encerrar de uma vez por toda o progresso da cidade. Dessa forma, Searcher se vê obrigado a voltar para as expedições, deixando de lado sua vida de fazendeiro.   Ao decorrer da história, podemos perceber que, apesar de Searcher sofrer com as expectativas do seu pai sobre ele, o personagem também repete esse ciclo comportamental com seu único filho, Ethan. Entretanto, agora, não é mais sobre ser explorador de locais desconhecidos, e sim manter o legado da família como fazendeiros. A relação entre eles, por vezes, gera situações com as quais nos identificamos muito bem, principalmente em momentos que nos vimos obrigados a fazer escolhas que os outros desejavam, mas não o que realmente queríamos. Ethan é um dos personagens mais interessantes do filme. Além de ser o primeiro adolescente abertamente gay criado pela Disney, a maneira como essa questão é tratada em Mundo Estranho ocorre de forma totalmente natural. Os diretores trabalham a sexualidade dele como um fato da vida, não algo que precisa ser aceito pela sociedade, dessa forma, há mais espaço para trabalhar a tensão dele com seu pai, as diferenças de desejos de cada um. Conforme a história se desenvolve e o núcleo principal começa a  investigar sobre o que pode ter acontecido com as plantas elétricas, somos introduzidos a um mundo completamente novo e fora da realidade, escondido abaixo das montanhas que cercam Avalonia. Se você já viu “Avatar”, filme de ficção científica de James Cameron (2009), as criaturas parecem familiares, com formas que lembram animais da nossa realidade, mas ainda com a impressão de que são místicas de alguma forma. Os cenários construídos em Mundo Estranho pelos animadores da Disney são maravilhosos, assim como as ocasionais cenas de ação. Seguindo o padrão das animações da empresa, há uma boa dose de humor introduzida na maior parte do tempo. Se prepare para rir com cenas que quebram as expectativas, como o cachorro Legend pulando em cima de qualquer um para lamber, ou a estranha figura de Splat, uma bola azulada com quem Ethan faz amizade. A criatura acaba sendo outro bom alívio cômico para a história. O grande destaque de Mundo Estranho não está em suas paisagens lindas ou em seu humor. A magia está nas relações familiares. As cenas tocantes de quando Jaegar, que encontrou esse mundo místico subterrâneo após se perder na expedição há 25 anos, reencontra Searcher, são um grande exemplo disso. A história dos Clades é cíclica, passa de geração em geração, com o mais velho querendo que o mais novo seja parecido com ele, impedindo-o de seguir seu próprio caminho e construir a própria história. Algumas cenas fazem com que os olhos se encham de água e a vontade de chorar se torne iminente. A julgar pelos últimos lançamentos da Disney, como Red: A Vida é Uma Fera (2022) e Encanto (2021), podemos falar que uma das principais pautas da empresa está nas relações familiares. Sobre círculos viciosos e como, na maior parte das vezes, é difícil se desvincular desses comportamentos tóxicos; nesse ponto, Mundo Estranho acerta precisamente nesse tom, aprofundando-se ainda mais nesse tema. Entretanto, todas essas relações ficam em segundo plano quando, nos atos finais do filme, somos apresentados ao verdadeiro problema da história: a Pando. A planta que trouxe progresso e modernização para a cidade de Avalonia é, na verdade, uma praga que está corrompendo uma criatura mística que carrega a cidade em suas costas. Sabe aquelas lendas antigas sobre tartarugas com verdadeiros universos em seus cascos? É algo parecido, mas esse enredo é colocado de forma tão aleatória nos momentos finais do filme que tudo parece meio desconexo. A preocupação com essa criatura mística que carrega o mundo em suas costas se torna aparente, mas as decisões dos personagens de serem portadores dessa mensagem ecológica não combina exatamente com eles — com exceção de Ethan. Parece até que esse arco foi introduzido no filme de última hora, para trazer a uma história já bonita algum significado ainda mais pesado e fazer as crianças entenderem a importância de proteger o meio ambiente. Afinal, ao decidirem destruir as raízes de Pando que estavam presentes no coração da criatura, os personagens renunciam a toda a modernização que a cidade alcançou nos últimos 25 anos.

Considerações finais

Apesar do roteiro por vezes confuso de Mundo Estranho, o longa se mostra um filme bom. O enredo familiar, as relações de pais e filhos, criado por Nguyen funciona muito bem quando ele usa as três gerações da família Clade: Ethan, Searcher e Jaegar, para comunicar as mensagens sobre os conflitos de cada uma e como é importante pensar no bem-estar dos próximos, sem a necessidade de forçar seus ideais. Esses momentos podem gerar grande identificação da audiência com os personagens, já que se trata de um assunto que pode acontecer em todas as famílias. Todavia, ele falha por trabalhar vagamente uma lição já bem transmitida de maneira primorosa em outras obras, sobre a catástrofe ambiental. O que nos faz pensar se não seria melhor deixar esse arco de lado, para desenvolver melhor outros personagens, que não tiveram tanto tempo de tela, mas foram igualmente cativantes.

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